Soberania Digital
Para que haja uma democracia viva e saudável, precisamos de um Estado de Direito funcional. A morosidade do sistema judicial, a corrupção e o sentimento de impunidade na prática de crimes públicos desgasta a credibilidade das nossas instituições e só contribui para o populismo daqueles que as querem...
Consagrar e garantir o direito à Internet Livre e sem censura, para todas as pessoas:
* garantindo que todo o território nacional tem cobertura de qualidade;
* garantindo que não há exclusão de acesso às cidadãs e aos cidadãos, independentemente da sua condição económica;
* fomentando a literacia digital e a capacidade digital;
* participando, enquanto país, na construção do Contract for the Web e defendendo os seus princípios, entre os quais a liberdade de expressão e de associação online e a encriptação das comunicações.
Garantir a neutralidade da rede, combatendo qualquer condicionalismo de velocidade de acesso ou qualquer discricionariedade de preço em função do serviço, tipo ou localização do conteúdo (incluindo o zero-rating, praticado por operadoras portuguesas).
Fomentar uma internet na qual as pessoas controlem os seus dados e atividade:
* impedindo a censura de conteúdos por parte de governos ou empresas;
* promovendo a encriptação forte nas comunicações via internet e adotando ferramentas de comunicação encriptada e código aberto, prevenindo pedidos do governo para que os prestadores criem backdoors (portas de acesso) em serviços encriptados;
* garantindo que os roteadores e modems façam parte do domínio dos consumidores;
* defendendo o direito à privacidade online e o direito ao esquecimento, devendo cada pessoa ter controlo sobre os seus dados pessoais;
* incentivando a adoção de normas de acesso aberto pelas plataformas online que permitam a interação entre utilizadores sem que tenham de facultar os seus dados e que permitam que troquem de plataforma sem perder os dados armazenados, evitando os efeitos de rede que são usados pelas plataformas para manterem posições dominantes.
Rever o Regulamento Nacional de Interoperabilidade Digital, fazendo a sua necessária atualização tecnológica e dotando-o dos mecanismos legais necessários para assegurar o seu cumprimento no sentido de criar nas pessoas e nos serviços do Estado a necessária independência dos fornecedores ou soluções de software.
Prevenir a vigilância em massa e o abuso do direito à privacidade através da tecnologia, banindo a utilização de dados biométricos recolhidos em massa (em espaço acessíveis ao público) para identificação, reconhecimento, profiling ou predição de ações de particulares, impedindo a violação de direitos fundamentais, em linha com a recomendação do Parlamento Europeu, e protegendo esses mesmos direitos de forma mais ambiciosa do que o AI Act; impedir também a utilização de sistemas de reconhecimento de emoções e do policiamento preditivo baseado na Inteligência Artificial.
Proteger as pessoas de práticas publicitárias intrusivas, nomeadamente impedindo a utilização de dados sensíveis, por exemplo dados sobre a origem étnico-racial, opiniões políticas, saúde e orientação sexual ou identidade de género, para direcionar publicidade a grupos específicos de pessoas, evitando assim situações que resultam na construção de realidades paralelas, isoladas, e impossíveis de escrutinar, com efeitos sociais nocivos de desagregação e polarização.
Reforçar a Autoridade Nacional das Comunicações (ANACOM) e a Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) para que possam identificar e agir de forma célere contra a propagação da desinformação e o discurso de ódio através da dotação de trabalhadores e recursos financeiros e tecnológicos dedicados.
Democratizar a investigação e a inovação:
* reforçando o direito de qualquer pessoa utilizar obras protegidas por direitos de autor na análise de dados e textos para fins de investigação científica, revendo a transposição do artigo 3.º da Diretiva Europeia de direitos de autor e direitos conexos no mercado único digital;
* fomentando a participação cidadã na definição da missão e do destino dos fundos de inovação;
* atribuindo mais recursos aos projetos cooperativos e às organizações da sociedade civil de cariz social;
* instituindo direitos de propriedade coletivos para os produtos resultantes do investimento público;
* garantindo a utilização livre de conteúdos em contexto de ensino.
Construir Bens Digitais Comuns:
* garantindo que todo o código desenvolvido com dinheiro público seja licenciado como código aberto;
* fomentando a construção colaborativa de software e hardware, expandindo a cláusula de “Uso Justo” em todas as leis de direitos de autor;
* fomentando a construção colaborativa e à escala Europeia de plataformas de redes sociais de gestão descentralizada, reforçando a soberania digital;
* revertendo o ónus da prova para que os bens sejam considerados bens digitais comuns, exceto se se provar estarem protegidos por direitos de autor;
* revendo a transposição dos artigos 15.º e 17,º (antigos artigos 11.º e 13.º) da Diretiva de direitos de autor e direitos conexos no mercado único digital, introduzindo mais salvaguardas e limitações para facilitar o acesso livre à informação e à criação.
Promover uma governação transparente, livre e de acesso aberto, com introdução de software livre e de código aberto em todos os níveis da administração pública e em instituições financiadas com recursos públicos, com todos os registos públicos não confidenciais digitalizados e publicados num banco de dados online aberto.
Garantir o acesso às aplicações da Administração Pública a todos os cidadãos sem
discriminação a um determinado fornecedor ou plataformaGarantir o acesso às aplicações da Administração Pública a todos os cidadãos sem discriminação a um determinado fornecedor ou plataforma. As aplicações devem também estar disponíveis para instalação diretamente dos sítios estatais, em vez de obrigar ao uso das lojas de aplicações das grandes tecnológicas. As funcionalidades dos vários serviços não devem estar disponíveis em exclusivo aos utilizadores de aplicações móveis.
A formação tecnológica providenciada ou financiada pela administração pública - incluindo o ensino escolar e universitário - deve ensinar técnicas e mecanismos, em detrimento de software específico, quebrando o ciclo vicioso de fomento ao uso de software e fornecedores específicos.
Prever a interoperabilidade obrigatória de todos os serviços tecnológicos contratados pelo Estado, garantindo a possibilidade de contratação de diferentes prestadores para a manutenção ou expansão de funcionalidades, evitando a dependência de fornecedores conhecida como “vendor lock-in”.
Fazer um levantamento da atual situação de dependência de terceiros - seja em termos de licenciamento ou fornecimento de software, hardware ou serviços - incluindo serviços de armazenamento remoto e tecnologias de inteligência artificial. A partir deste levantamento, será possível evitar riscos respeitantes a impacto financeiro, disponibilidade e confiabilidade de sistemas e serviços, além da segurança de serviços e dados.
Reforçar as proteções legais e regular a Inteligência Artificial
Garantir Direitos de Cibersegurança:
* garantindo que todos os produtos digitais sejam configurados como privados por omissão;
* restringindo e monitorizando a venda e o acesso a dados de utilizadores a terceiros sem consentimento explícito (com especial focos nos chamados data brokers);
* respeitando o direito de saber quando se está em interação com um algoritmo;
* consagrando o direito à igualdade de tratamento, assegurando a não discriminação – de género, racial, étnica, sexual ou outra qualquer – com base em algoritmos digitais;
* estabelecendo regras de transparência dos algoritmos, nomeadamente das redes sociais e de plataformas de venda e arrendamento com preços dinâmicos;
* reforçando o orçamento e condições do Centro Nacional de Cibersegurança e tornando obrigatório o seu parecer favorável para a utilização de novas tecnologias digitais em serviços públicos;
* desenvolvendo uma Certificação Nacional de Cibersegurança para serviços na nuvem utilizados por empresas do Estado, alinhada com o futuro Esquema Europeu de Certificação de Cibersegurança (EUCS).
Precaver os riscos da massificação da Internet das Coisas, promovendo legislação europeia que preserve a segurança e privacidade das nossas casas e objetos, prevenindo abusos por parte de fornecedores e plataformas e exigindo prestação de informação sobre os ganhos das grandes tecnológicas resultantes da cedência de dados pessoais de utilizadores.
Criar a Agência Portuguesa para a Inteligência Artificial (APIA, I.P.), com o propósito de:
* incentivar a inovação, a investigação científica e a utilização de Inteligência Artificial (IA) em usos técnicos e empresariais, incluindo na concessão de subsídios, bolsas, prémios e estabelecimento de projetos colaborativos entre academia, empresas, setor público e social ou cooperativo, designadamente em articulação com a Academia, com a Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT) e com a sociedade civil;
* educar, capacitar e consciencializar, através da promoção de projetos educativos, campanhas de informação e alerta sobre os desafios, ameaças, oportunidades e políticas públicas de mitigação de riscos da emergência da IA;
* apoiar a criação de um Laboratório Europeu para a IA;
* regulamentar através da constituição de um organismo regulador com quadro de pessoal capacitado para a implementação da legislação nacional e europeia para o setor da IA, a trabalhar em ativa parceria com instituições com o mesmo propósito noutros Estados-Membros da União Europeia.
Estabelecer um órgão regulador de tecnologias de Inteligência Artifical e machine learning incorporado na Agência Nacional para a Inteligência Artificial que actue coordenado com as diretivas europeias e em conjunção com os reguladores setoriais das áreas em que estas tecnologias sejam aplicadas, e precaveja as consequências da recolha e tratamento em massa de dados, sendo o seu aval condição necessária para a implementação de ferramentas construídas com estas tecnologias que de algum modo processem dados das pessoas, quer por parte do Estado, quer por parte de instituições privadas (por exemplo, provedores privados de Saúde e companhias de seguros).
Assegurar o controlo humano dos sistemas de Inteligência Artificial utilizados pelo Estado, assegurando que os seus algoritmos não reforçam formas de discriminação, e rejeitando a sua inclusão na gestão de infraestruturas críticas.
Prevenir a discriminação algorítmica de vencimentos, nomeadamente nas plataformas de falso trabalho independente, exigindo que as empresas apresentem aos trabalhadores um método de cálculo escrutinável dos valores pagos, impedindo alterações rápidas e arbitrárias da remuneração por trabalho igual com base em factores como localização, comportamento individual ou predição de procura e oferta.
Abolir as práticas de manipulação de consumidores em compras na internet conhecidas como “junk fees”, obrigando à apresentação dos preços totais das compras e proibindo a publicitação de preços parciais quando não é possível evitar taxas adicionais; impedindo custos adicionais pela escolha, por parte do consumidor, de métodos de pagamento ou a cobrança de valores regulares que não chamem a atenção sobre a despesa efetiva, face a métodos de pagamento passivos (por exemplo, taxa aplicada em modalidades de pagamento que não o débito direto em conta).